Meu pai nunca foi de ficar doente. Em 76 anos de vida, só lembro de uma internação, por um acidente de trabalho, quando ele tinha 29. Eu era só uma criança de 4 anos, mas até hoje me lembro das imagens daquele momento. Gravadas na memória como filme antigo. Depois disso, a vida seguiu. Saudável, sorridente, sempre disposto.
Com o tempo, começaram os sinais de envelhecimento. Um incômodo aqui, outro ali. A próstata aumentada foi o primeiro desafio. Nada grave, segundo todos os exames. Mesmo assim, ele relutava. Talvez medo, talvez orgulho, talvez os dois. Quando finalmente decidiu encarar a cirurgia, tudo correu bem. Alta no dia seguinte, recuperação tranquila. Mas uma febre repentina insistia em dizer que algo não estava como deveria.
Desconfiamos da cirurgia. Exames. Avaliações. Estava tudo certo. Novas hipóteses: dengue, chikungunya, leptospirose, hepatite, cirrose, HIV, cálculo biliar… tudo descartado. A resposta só veio com uma biópsia de medula: mielodisplasia. Um nome difícil, para uma doença ainda mais dura. Fomos para Maringá, começamos a luta, tivemos alta, voltamos pra casa.
Por uma semana, tentamos fingir normalidade. Uma semana. Foi o tempo que uma infecção renal precisou para levá-lo de volta ao hospital, direto para a UTI. Mas ele resistia. Saiu da UTI, foi para o quarto, nos deu mais nove dias. Dias intensos. Cheios de conversas, olhares, silêncios, até um choro ou outro. Uma intimidade que, talvez, só a proximidade da morte permite.
Meu pai nunca foi de lamentar. Não mudou nos últimos dias. Sorriu até onde deu. Enfrentou como sempre viveu: com dignidade. Mas também com medo. Não da dor, não do hospital, mas da morte. Ele lutou porque queria viver. E deixou claro: não queria morrer. Sabia que algo grave o rondava e sentia que a doença podia vencê-lo. Mas não se entregou. Agiu como quem acredita que ainda havia muito a viver. E havia.
Infelizmente, a doença foi mais rápida que o tratamento. Não deu tempo. E é aí que a morte escancara a sua face mais cruel. Não pelo fim em si, mas pela interrupção. Pela sensação de que algo ficou por fazer, por dizer, por viver.
Mas, mesmo no adeus, ele nos deixou lições. Sobre leveza, coragem, amizade e amor. Sobre o valor de uma conversa simples. De uma piadinha, de uma sátira. De um sorriso sincero. De estar presente de verdade.
A morte, com todo o seu peso, às vezes nos rouba, mas também revela. Nos faz olhar para o essencial. E o essencial, no caso do meu pai, era ele mesmo: um homem de bem, de risos fáceis, que fez da vida algo bom de se viver.
Que agora ele descanse.
Ele era um homem simples sempre com um sorriso no rosto,admirável, dócil. Assim como a Nassi,sua fiel companheira! Que Deus conforte todos e os mantenha unidos no Seu precioso amor!