A decisão do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR), que confirmou o afastamento do mandato do vereador Fernando Nègre (PT) porque a Federação Brasil da Esperança cometeu fraude à cota de gênero, foi classificada como “histórica” pelo advogado eleitoralista João Gustavo Bersch, responsável pela condução jurídica do caso em defesa do Partido Liberal (PL).
Durante entrevista coletiva realizada nesta quarta-feira (12), o advogado destacou que é a primeira vez que Marechal Cândido Rondon tem um vereador cassado por decisão judicial e a primeira vez que a Justiça Eleitoral reconhece uma fraude à cota de gênero no município.
“É uma decisão inédita, de alto valor simbólico e jurídico. Um caso complexo, que exigiu a produção de uma prova negativa, ou seja, provar que uma candidata não realizou atos efetivos de campanha”, explicou Bersch, ressaltando o caráter desafiador da ação.
“Vitória da democracia e das mulheres”
O presidente do PL em Marechal Rondon, ex-vereador Arion Nasihgil, abriu a coletiva enfatizando que a decisão não representa uma comemoração pela derrota de um adversário, mas sim pela vitória da democracia e pelo respeito às mulheres.
“Não estamos comemorando a cassação de um vereador, mas o cumprimento da lei e o fim do desrespeito às mulheres que sonharam com uma vaga legítima”, disse.
Segundo ele, o PL foi “correto, sério e trabalhador” ao lançar candidatas com viabilidade real de eleição, e não apenas “nomes de fachada”.
Arion afirmou ainda que “a fraude à cota de gênero é uma fraude ao direito das mulheres” e que o partido não poderia se calar diante de “um desrespeito tão claro ao processo eleitoral”.
A nova fase
Ao lado do presidente do partido e do corpo jurídico, o Policial Fábio participou da coletiva como o vereador que assumirá a vaga que será deixada por Nègre. Em tom sereno, ele agradeceu o apoio do partido e disse que sua atuação será de “muito trabalho e comprometimento com a população”.
“Eu vesti a camisa do PL na campanha e agora vou vestir a camisa de Marechal Cândido Rondon. Não serei apenas mais um, serei um vereador ativo e atuante”, afirmou.
A publicação do acórdão da decisão do TRE deve ocorrer ainda nesta semana, abrindo o prazo de três dias para eventual embargo de declaração por parte da Federação. Mesmo que o caso seja levado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o recurso não terá efeito suspensivo, o que permitirá a posse de Fábio nas próximas semanas. A previsão é de aproximadamente 20 dias.
O alerta que fica
A decisão do TRE-PR não é isolada. Nos últimos meses, várias cidades paranaenses e brasileiras tiveram chapas inteiras cassadas por candidaturas femininas apenas “para cumprir tabela”. Geralmente, as mulheres sequer fizeram campanha, não tiveram votos expressivos ou chegaram a declarar gastos eleitorais.
Esse tipo de manobra tem se tornado comum e perigosa. Além de ferir o princípio da igualdade de gênero, coloca em risco toda a chapa, podendo anular os votos e alterar o resultado das urnas, como aconteceu agora em Marechal.
O alerta vale para todas as siglas: não basta preencher a cota, é preciso promover a participação real da mulher.
A lei eleitoral exige que ao menos 30% das candidaturas seja de cota de gênero, mas o espírito da norma é muito mais profundo do que uma simples conta. Ela busca corrigir uma desigualdade histórica e abrir espaço para que mulheres possam competir em condições justas.
Os números mostram o tamanho do desafio. Em Marechal Cândido Rondon, desde 1960, apenas quatro mulheres foram eleitas vereadoras. No Brasil, mesmo com as cotas, a presença feminina nas câmaras municipais mal passa dos 16%.
A decisão que envolve o caso de Marechal e tantos outros por aí, é uma lição política. Ela mostra que o tempo das candidaturas de fachada acabou e que o respeito à lei da cota de gênero deve vir acompanhado de políticas internas de valorização da mulher.
